domingo, 19 de julho de 2009

Onda de escândalos não gera punição aos congressistas




Só diretores, servidores e domésticas são punidos; de 32 casos, 23 tiveram medidas parciais de correção e 9 ainda estão impunes

Com a sucessão de crises, produtividade na Câmara caiu 18% em relação ao mesmo período de 2008 e a do Senado Federal, 10%
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Prestes a completar seis meses, a onda de escândalos no Congresso Nacional até agora não resultou em punição para nenhum deputado ou senador.
A responsabilização recaiu apenas sobre o elo mais fraco: diretores, servidores e empregadas domésticas. Algumas medidas administrativas pontuais foram tomadas.
A Folha listou 32 casos desde o primeiro episódio, no início de fevereiro. A sucessão de crises afetou um pouco a produtividade dos congressistas, mas não chegou a travar os trabalhos parlamentares.
Na Câmara, foram aprovadas 53 matérias no primeiro semestre de 2009, queda de 18% sobre igual período do ano passado. No Senado, foram 83 projetos aprovados, 10% menos do que em 2008.
Eleitos em 2 de fevereiro, os presidentes da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP), tiveram pouco tempo para respirar antes das primeiras denúncias.
Dois dias após a posse, veio à tona o "castelogate", a revelação de que o recém-eleito corregedor da Câmara, Edmar Moreira (ex-DEM-MG), escondeu da Justiça um castelo avaliado em R$ 25 milhões.
Na semana passada, Moreira foi absolvido no Conselho de Ética da Câmara da acusação de ter pago seus seguranças privados com a verba indenizatória.
O caso é emblemático da maneira como o Congresso tem respondido à sucessão de denúncias. Dos 32 casos, 23 tiveram medidas parciais de correção ou punição e 9 não tiveram nenhuma consequência.
Se os escândalos começaram na Câmara, foi no Senado, palco de 25 casos, que eles se tornaram uma crise de grandes proporções, ameaçando até o mandato de Sarney como presidente. Cinco casos ficaram restritos à Câmara, e dois envolveram ambas as Casas.
No Senado, o estopim foi a reportagem da Folha de 2 de fevereiro mostrando que o ex-diretor-geral Agaciel Maia escondia da Justiça a casa avaliada em R$ 5 milhões em que mora em Brasília.
A revelação derrubou Agaciel, no cargo havia 14 anos, e homem de confiança de seu padrinho político, Sarney, e do ex-presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL).
A queda do homem-forte do Senado deu início a uma guerra interna. Petistas inconformados com a vitória de Sarney aproveitaram o momento para tentar fragilizar os peemedebistas -e levaram o troco. O senador Tião Sarney (PT-AC), derrotado pelo maranhense, acabou chamuscado com a revelação de que emprestou um celular do Senado para a filha usar em uma viagem ao México. A conta passou de R$ 14 mil.
Dentro da burocracia da Casa, a disputa entre "agaciboys" e facções rivais ao ex-diretor-geral ajudou a abrir a caixa-preta do Senado, uma das maiores de Brasília.
Vazamentos de atos, nomeações políticas e salários exorbitantes jogaram um pouco de luz sobre uma Casa em que não se sabia nem mesmo o número de diretorias, ou o local de trabalho de grande parte de seus 10 mil servidores.
Foi a partir da crise que se soube, por exemplo, que horas extras eram pagas a servidores no recesso parlamentar de janeiro. Que senadores fretavam jatinhos para viajar a seus Estados. Ou que parlamentares com residência em Brasília recebiam auxílio-moradia.
Em meados de junho, a crise, que afetava o Senado de maneira global, aproximou-se da cadeira de Sarney. A revelação feita pelo jornal "O Estado de S. Paulo" de que Agaciel escondia em atos secretos nomeações, aumentos de salário e concessão de benesses abriu nova frente na crise.
Parentes de Sarney e de seus aliados pendurados em gabinetes ou operando no Senado começaram a aparecer. Um mordomo da família recebia como assessor público. A casa do presidente em Brasília não foi declarada à Justiça Eleitoral. A fundação que cuida de seu acervo em São Luís operava com empresas-fantasmas.
Secretas também eram contas bancárias sem fiscalização nenhuma, operadas por Agaciel -suspeita-se que como uma espécie de banco privado para socorrer senadores endividados, caso do líder do PSDB na Casa, Arthur Virgílio (AM).
Em uma tentativa de responder, Sarney mandou colocar na internet toda a relação de servidores e contratos. Foi a vez de nepotismo, aparelhamento político de gabinetes e existência de funcionários-fantasmas serem escancarados.

Cotas aéreas
Sem uma guerra comparável à do Senado, a Câmara nem por isso escapou ilesa da onda de escândalos. Acabou atingida pela farra das passagens aéreas, em que deputados cediam bilhetes de suas cotas mensais para amigos, parentes e aliados.
Num exemplo famoso, o deputado Fábio Faria (PMN-RN) presenteou sua então namorada, a apresentadora Adriane Galisteu, com uma passagem para o Carnaval fora de época em Natal. Mas a Câmara não viu problema e absolveu Faria com o argumento de que não havia regra contra a prática. Na mesma toada, casos semelhantes devem ir para o arquivo.
A única concessão a qualquer tipo de apuração foi a criação pela Câmara de uma comissão de sindicância para analisar um ponto específico da farra: a venda ilegal, por alguns gabinetes, de passagens da cota parlamentar para agências de viagem. O resultado deve sair em agosto.
A Câmara teve ainda "farra das domésticas". Pelo menos três deputados -Arnaldo Jardim (PPS-SP), José Paulo Tóffano (PV-SP) e o licenciado Alberto Fraga (DEM-DF)- contratavam suas empregadas como assessoras de gabinete.
Em um exemplo perfeito do modus operandi do Congresso na apuração das denúncias, as empregadas foram todas demitidas sumariamente. Os deputados nem foram investigados. (ADRIANO CEOLIN, ANDREZA MATAIS, FÁBIO ZANINI, JOHANNA NUBLAT E MARIA CLARA CABRAL)

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