Flagrado em ‘grampo’ da Polícia Federal, Ernane Sarney foi nomeado chefe da Assessoria de Programas Especiais
A ocupante do governo do Maranhão, Roseana Sarney Murad (PMDB), nomeou seu tio Ernane César Sarney chefe da Assessoria de Programas Especiais da Casa Civil. Ele é o segundo integrante do clã Sarney a ocupar um cargo no governo roseanista, instalado em 17 de abril, depois da cassação do governador eleito, Jackson Lago (PDT). O primeiro parente de Roseana a integrar o governo foi Ricardo Murad, seu cunhado, que assumiu a Secretaria de Saúde. A nomeação de Ernane Sarney foi publicada na edição do último dia 7 do Diário Oficial e revelada ontem com exclusividade no blog do jornalista Raimundo Garrone, hospedado no site do Jornal Pequeno.
Conhecido como “Gaguinho”, Ernane Sarney (irmão mais novo do presidente do Senado, José Sarney) foi flagrado num “grampo” da Polícia Federal – ao qual o JP teve acesso – cobrando “propina” de Gil Jacó Carvalho Santos, diretor financeiro da Gautama, construtora de Zuleido Veras, que operacionalizava um esquema fraudulento em licitações de obras públicas. Gil Jacó foi um dos 61 denunciados em maio de 2008 pelo Ministério Público Federal (MPF) no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ernane Sarney, apesar de ter seu nome citado mais de uma dezena de vezes na agenda de Zuleido, nunca foi indiciado.
Com a ‘corda no pescoço’ – A conversa entre Ernane e Gil Jacó – interceptada com autorização judicial, no bojo da “Operação Navalha” – aconteceu em 2007. Nela, Ernane cobra de Gil Jacó, às vezes de forma agressiva, o pagamento de valores prometidos e não honrados (veja íntegra no destaque).
Num certo trecho, Ernane diz que está “com a corda no pescoço” e que “o pessoal aqui [no Maranhão] também tá com a corda no pescoço”, dando a entender que não era o único beneficiário do pagamento. “Você disse que ia pagar, rapaz! Já tava tudo na mão, eu não sei o que tá acontecendo. Tão me enrolando”, irrita-se Ernane, em outro momento da conversa.
“Tava na mão, tava na mão [o dinheiro]. Só conversa, rapaz. Eita, porra!”, explode finalmente o tio de Roseana Sarney, para depois exigir de Gil Jacó: “Rapaz, fala com ele. Bota isso em prioridade”. “Ele”, no caso, seria o “chefão” do esquema Gautama, Zuleido Veras.
Mulher também envolvida no ‘propinoduto’ – Em junho de 2008, o JP revelou que também a mulher de Ernane Sarney – Shirley Duarte Pinto de Araújo – participou do esquema do “propinoduto” da Gautama. Durante as investigações da “Operação Navalha”, chefiadas pela delegada Andréa Tsuruta, foram apreendidos na Gautama comprovantes de depósitos feitos pela construtora na conta da mulher de Ernane. Pelo que se concluiu das investigações, o tio de Roseana Sarney seria o real beneficiário do dinheiro.
Para fugir da fiscalização dos órgãos de combate a ilícitos financeiros, os depósitos (dois) foram fracionados, a fim de não se atingir o valor de R$ 10 mil em cada operação. Num depósito, feito às 15h20 do dia 7 de abril de 2006, o valor é de R$ 9.950. No mesmo dia, cinco minutos depois (15h25), foi realizado um depósito de R$ 50.
Roseana na agenda de Zuleido – O nome de Roseana Sarney também aparece várias vezes na agenda de Zuleido Veras, apreendida pela Polícia Federal na “Operação Navalha”, em maio de 2007. Num registro feito no dia 14 de abril, o nome de Roseana está ao lado de uma cifra de R$ 63 milhões. Já em 16 de agosto de 2006 (dois meses antes da eleição para o governo do estado), a quantia anotada junto ao nome da ocupante do governo maranhense aumenta para R$ 200 mil. Outro apontamento, feito em 14 de julho de 2006, registra o valor de R$ 1 milhão, destinado à campanha política do Maranhão.
Diálogo entre Ernane Sarney e o ‘homem das propinas’ da GautamaGil: Alô?
Ernane: Alô, Gil?
Gil: Oi!
Ernane: É o Ernane, rapaz, de São Luís!
Gil: Oi, dr. Ernane, como vai?
Ernane: Tá tudo bem. Eu fui aí no casamento, rapaz, falei... nós conversamos com o Ney aí, voltei com ele, e ele disse que tá tudo certo, e aí quando chega aqui...
Gil: O senhor teve aqui?
Ernane: Fui, fui.
Gil: O senhor teve no casamento?
Ernane: Fui, fui.
Gil: Mas rapaz, eu não sabia. Se eu soubesse eu lhe procurava lá, para conhecer o senhor.
Ernane: É, ahã, tinha falado.
Gil: Eu tava lá.
Ernane: Tu tava lá (...), e aí ele falou que vocês tavam tudo lá, mas aí não deu pra encontrar, muita gente, muita confusão.
Gil: Muita gente, muita gente!
Ernane: É (...) a gente pelo menos tinha falado.
Gil: Ahã...
Ernane: Tinha conversado lá. Tá bom! E aí? Como estão as coisas? Você disse que ia pagar, rapaz!
Gil: Tão aqui. Tão começando a melhorar aqui, rapaz. Mas até agora não melhorou, não. A gente tá pra receber um recurso, tá pra entrar aqui, de Alagoas, aqui.
Ernane: Mas não tava certo isso aí, rapaz? Já tava tudo na mão e eu não sei o que tá acontecendo. Tão me enrolando.
Gil: Senhor? Tô não, doutor.
Ernane: Tava tudo certo, o meu amigo disse que tava tudo certo aí, que agora ia, fazer logo agora... ih, rapaz.
Gil: É, e tá pra fazer aqui, eu tive que pagar a folha, doutor. Eu tive que pagar os peões aqui, se não, ia parar as coisas aqui.
Ernane: Eu sei que tem muita coisa, mas aí também, mas rapaz... Eu vi que esse negócio (...) na hora que aquele veio pra cá, com aquela porcaria, eu disse que tinha enrolada. “Não, tava na mão, tava na mão”, só conversa rapaz. Eita, porra. E aí, como é que eu faço?
Gil: Essa semana, eu vou (...), até sexta-feira eu devo conseguir, aí.
Ernane: Ah, semana passada, era um dia pra tu me pagar. Segunda-feira tava na mão. Ia sair de noite. Tô esperando até hoje.
Gil: Até hoje não consegui.
Ernane: É rapaz, tá brabo isso. Rapaz, fala com ele. Bota isso em prioridade.
Gil: Vou, vou falar com ele.
Ernane: Bota prioridade aqui, ele me garantiu.
Gil: Uhum, eu vou falar com ele, vou dar uma ligada pra ele.
Ernane: É, eu to esperando, mas o telefone de vocês não liga, só recebe, o que eu tô vendo.
Gil: O meu telefone tá normal aqui, o senhor...
Ernane: Não! Só tá recebendo, ligar, tu, tu, tu, tu diz que vai ligar, vai ligar, e nunca liga, e nunca acontece, e ainda eu tô vendo que esse negócio não tá certo, não.
Gil: Mas vai resolver, doutor.
Ernane: É, vai! Por Deus, vai, mas eu tô com a corda no pescoço, o pessoal também tá com a corda no pescoço, aqui, rapaz. É uma parada, você diz uma coisa... Eu não sei. Tá bom, vou perturbar ele lá.
Gil: Até logo, doutor. Obrigado.
Fonte: Jornal Pequeno
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